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A Síndrome de Estocolmo dos Marketplaces: a perda de controle dos empresários brasileiros

Nos últimos anos, os marketplaces têm se consolidado como grandes protagonistas no e-commerce brasileiro. Plataformas como Mercado Livre, Amazon, Magalu, Shopee e iFood ofereceram a oportunidade para pequenos e grandes empresários se conectarem diretamente com milhões de consumidores, facilitando o acesso a um mercado amplo e diversificado. No entanto, com essa facilidade, surge um grande perigo: a dependência extrema desses canais, criando o que chamo de “Síndrome de Estocolmo dos Marketplaces”.

O que é a Síndrome de Estocolmo e sua analogia com os Marketplaces

A Síndrome de Estocolmo é um fenômeno psicológico em que a vítima de um sequestro, por razões diversas, acaba desenvolvendo uma espécie de afeição ou aliança com o sequestrador. Ao fazer uma analogia com o mercado atual, os empresários, que inicialmente veem nos marketplaces uma solução para seus negócios, acabam se “apaixonando” por eles a ponto de perderem o controle de suas operações, ficando reféns dessas plataformas.

Essas plataformas trazem enormes vantagens, especialmente para quem está começando no mundo online. Vender em um lugar onde milhões de consumidores já estão prontos para comprar parece uma jogada de mestre. O problema, porém, é quando o empresário coloca todas as suas fichas em um único canal, chegando a 80% ou 90% de suas vendas concentradas em marketplaces. Essa concentração é extremamente perigosa, pois reduz drasticamente a autonomia do negócio.

O boom dos Marketplaces no Brasil

Nos últimos cinco anos, os marketplaces tiveram um crescimento explosivo no Brasil. Segundo o relatório da Ebit|Nielsen, o e-commerce brasileiro cresceu 27% em 2021, e grande parte desse aumento foi impulsionado pelos marketplaces. Plataformas como Mercado Livre e Amazon viram um aumento de vendedores e consumidores, atraindo um público que busca conveniência e variedade de produtos. Empresas como Magalu e Shopee, por sua vez, investiram pesado em campanhas de marketing e infraestrutura, conquistando rapidamente uma base de clientes fiéis.

Esse cenário ajudou muitos empresários a acessar o mundo digital sem grandes investimentos iniciais. No entanto, essa facilidade trouxe consigo um risco: a falta de controle sobre o futuro do negócio e a dependência excessiva dessas plataformas para sobreviver.

A perda de controle e a falta de diversificação

Ao depender exclusivamente dos marketplaces, o empresário adia o aprendizado de como trabalhar com seu próprio marketing, construir uma marca sólida e, principalmente, diversificar seus canais de vendas. Nos marketplaces, a guerra é travada em termos de preço. A marca do empresário se dilui, e ele se torna apenas mais um vendedor em uma plataforma altamente competitiva, muitas vezes prejudicando sua política de preços para conseguir vender.

Essa falta de controle é alarmante. A empresa não controla mais sua precificação, suas margens de lucro são comprimidas pelas taxas e comissões cobradas pelos marketplaces, e a fidelidade do cliente fica, muitas vezes, ligada à plataforma e não ao negócio. Além disso, quando se depende tanto de um único canal, uma mudança nas políticas do marketplace pode ter um impacto devastador, colocando em risco a sobrevivência do negócio.

Casos reais de dependência e como superá-la

Empresas de diversos setores estão enfrentando o desafio da dependência dos marketplaces. No setor de moda e eletrônicos, por exemplo, muitas marcas começaram a vender exclusivamente por plataformas como o Mercado Livre, Amazon, Shopee e Magalu. Inicialmente, as vendas dispararam, mas com o tempo, essas empresas perceberam que estavam em uma constante guerra de preços, sem conseguir se diferenciar ou criar uma identidade de marca. Empresas que conseguiram sair dessa armadilha, como a XYZ Moda, começaram a investir em suas próprias plataformas de e-commerce e campanhas de marketing digital, reduzindo sua dependência dos marketplaces e construindo um relacionamento direto com seus consumidores.

No setor de alimentação, lanchonetes e hamburguerias que se tornaram reféns do iFood enfrentam um cenário semelhante. Em muitos casos, até 80% das vendas dessas empresas são realizadas por meio da plataforma, criando uma dependência perigosa. Com o iFood dominando o mercado de entregas, esses restaurantes acabam tendo pouca ou nenhuma margem para negociação de taxas e comissões, além de perderem o contato direto com seus clientes. Isso diminui sua capacidade de controlar a experiência do consumidor e fidelizá-lo diretamente.

Estratégias para Superar a Dependência em Diferentes Setores

Para empresas que dependem de marketplaces, sejam elas do setor alimentício ou de varejo, existem diversas estratégias que podem ser implementadas para diversificar canais de vendas e retomar o controle sobre o negócio:

1. Implementar um sistema próprio de vendas e entregas

  • Lanchonetes e Hamburguerias: Ao invés de depender exclusivamente do iFood, muitos restaurantes podem criar um sistema de entrega próprio. Isso pode ser feito através do desenvolvimento de um aplicativo exclusivo ou utilizando plataformas locais de delivery, onde as taxas são menores e o controle sobre a operação é maior. Dessa forma, é possível atrair clientes que valorizam um atendimento mais personalizado e preços competitivos fora das grandes plataformas.
  • Empresas de Varejo: Para lojas de eletrônicos, moda e outros bens de consumo presentes na Amazon, Mercado Livre ou Shopee, a criação de um site e-commerce próprio é essencial. Plataformas como Tray e Nuvemshop oferecem soluções acessíveis para implementar uma loja virtual robusta, garantindo controle total sobre vendas, entrega e comunicação com os clientes.

2. Fidelizar clientes diretamente

  • Lanchonetes e Restaurantes: Programas de fidelidade, onde o cliente acumula pontos ou recebe descontos por fazer pedidos diretamente pelo site ou telefone, são ótimas formas de incentivar o consumo fora dos marketplaces. Esses programas não apenas aumentam a recorrência dos pedidos como também ajudam a fidelizar os clientes.
  • Varejo: No varejo, uma boa estratégia é oferecer vantagens exclusivas para clientes que compram diretamente no site da empresa. Isso pode ser feito através de programas de cashback, onde uma porcentagem do valor gasto é devolvida como crédito para futuras compras, ou por meio de promoções personalizadas enviadas por e-mail marketing ou redes sociais.

3. Incentivar o consumo local e direto

  • Alimentação: Muitos restaurantes podem incentivar clientes locais a fazerem pedidos diretamente com o estabelecimento oferecendo descontos exclusivos ou promoções para quem retira no local. Além disso, campanhas nas redes sociais podem ser criadas para destacar os benefícios de comprar diretamente do restaurante, como rapidez no atendimento e preços melhores.
  • Varejo: Para empresas que dependem de marketplaces como Mercado Livre ou Shopee, uma boa tática é usar as redes sociais e e-mails para educar os clientes sobre os benefícios de comprar diretamente da loja oficial. Isso pode incluir promoções exclusivas, entrega grátis ou brindes, além de destacar o suporte mais ágil e personalizado.

4. Expandir a presença em múltiplos Marketplaces

  • Para empresas de varejo, uma estratégia eficaz pode ser a diversificação entre diferentes marketplaces. Em vez de concentrar todas as vendas em uma única plataforma como Amazon ou Mercado Livre, empresas podem cadastrar seus produtos em múltiplos marketplaces, como Magalu e Shopee, para atingir diferentes públicos e reduzir o risco de dependência de um único canal.

5. Campanhas com Influenciadores e Marketing de Indicação

  • Lanchonetes e Restaurantes: Parcerias com influenciadores locais que promovem os produtos em suas redes sociais podem trazer mais visibilidade para as marcas e gerar um aumento de pedidos diretos. Outra excelente estratégia é o marketing de indicação, onde clientes que recomendam o restaurante a amigos ou familiares recebem benefícios, como descontos ou brindes.
  • Varejo: No caso das empresas de varejo, campanhas com influenciadores e parcerias com criadores de conteúdo nas redes sociais ajudam a gerar tráfego direto para o site da empresa, sem depender exclusivamente dos marketplaces. Além disso, um programa de indicação para clientes satisfeitos pode ser uma maneira eficaz de atrair novos compradores com custos menores de aquisição.

6. Promoções e ofertas sazonais

  • Lanchonetes e Restaurantes: Criar ofertas sazonais e personalizadas, como descontos para eventos especiais (aniversários, datas comemorativas) ou promoções em horários de menor movimento, pode atrair mais clientes diretamente para a loja ou site do restaurante.
  • Varejo: Para empresas no varejo, promoções alinhadas a datas comemorativas, como Black Friday, Dia das Mães ou Natal, são ótimas oportunidades para atrair clientes para o site próprio da marca, especialmente quando combinadas com campanhas de redes sociais e e-mail marketing.

Essas estratégias, quando aplicadas de forma consistente, ajudam a empresa a reduzir sua dependência dos marketplaces, tanto no setor alimentício quanto no varejo, enquanto constroem um relacionamento mais direto e fiel com os consumidores. Ao implementar essas táticas, as empresas podem recuperar o controle de suas operações, aumentando as margens de lucro e fortalecendo sua presença de marca no mercado.

Construção de marca no ambiente digital

Um dos maiores desafios de vender exclusivamente em marketplaces é a dificuldade de construir uma marca forte e reconhecida. Diferente de um ambiente controlado, como o site próprio da empresa, onde a marca pode se destacar por meio da experiência do cliente, valores, design, atendimento personalizado e outros diferenciais, no marketplace a briga é feroz, e o menor preço muitas vezes vence. Essa dinâmica não apenas erode as margens de lucro, como pode prejudicar a percepção da marca.

Além disso, os consumidores raramente percebem de quem estão comprando. Para eles, o importante é a plataforma e o preço. Isso significa que, ao vender exclusivamente em marketplaces, o empresário perde a oportunidade de fidelizar seus clientes diretamente. Com isso, a construção de marca se torna extremamente limitada, colocando o negócio em uma posição de vulnerabilidade.

Para contornar isso, é essencial que os empresários invistam em canais próprios de venda, como um site e-commerce bem estruturado, e em estratégias de marketing digital, como SEO e redes sociais. Ao criar um site próprio, o empresário controla a experiência do cliente, os preços, a comunicação e a fidelização.

Soluções práticas para diversificar vendas

Diversificar os canais de vendas é essencial para qualquer negócio que deseja crescer de forma sustentável e escapar da dependência dos marketplaces. Além das estratégias mencionadas anteriormente, como fortalecer o e-commerce próprio, fidelizar clientes diretamente e utilizar campanhas de marketing digital, há outras abordagens táticas e diferenciadas que podem ser incorporadas para alcançar mais autonomia. Aqui estão soluções complementares e ainda não mencionadas no artigo:

1. Automatização de processos de vendas

  • Varejo e Alimentação: Investir em ferramentas de automação de marketing e gestão de vendas pode reduzir a dependência de marketplaces, otimizando o tempo e a eficiência das operações de vendas diretas. Com softwares de CRM (Customer Relationship Management), é possível automatizar e personalizar o relacionamento com os clientes, criando jornadas de compra mais fluídas e eficazes.
  • Isso é particularmente útil para e-commerce, onde a automação de e-mails, follow-ups e reengajamento de clientes inativos pode gerar um fluxo constante de vendas, sem depender de intermediários.

2. Ampliação de canais de atendimento e suporte

  • Varejo: Oferecer suporte ágil e acessível é um diferencial importante para quem deseja se destacar fora dos marketplaces. Ferramentas como chatbots, WhatsApp Business e assistência por redes sociais permitem interagir diretamente com os clientes e resolver problemas com rapidez. O atendimento eficaz pode ser o fator decisivo para a fidelização de clientes, principalmente quando comparado ao suporte mais genérico oferecido em plataformas de marketplaces.
  • Alimentação: No setor de alimentação, o atendimento personalizado por aplicativos de mensagens ou chat online também pode melhorar a experiência do cliente, incentivando-o a realizar novos pedidos diretamente.

3. Testar novos canais de vendas e expansão geográfica

  • Varejo: Expandir a atuação para novos mercados geográficos é uma forma de diversificar as fontes de receita. Empresas podem explorar a venda para outras regiões ou até países, especialmente se os marketplaces forem limitados a áreas específicas. Para isso, uma loja virtual com capacidade de envio para diferentes regiões, combinada com estratégias de marketing geolocalizado, pode abrir novas oportunidades de negócio.
  • Alimentação: No caso de restaurantes ou lanchonetes, a expansão geográfica pode ser feita por meio de novos pontos de entrega, seja por delivery local ou expansão física para novos bairros ou cidades.

4. Explorar modelos de assinatura

  • Varejo e Alimentação: Modelos de assinatura recorrente estão ganhando força e podem ser uma excelente maneira de garantir previsibilidade financeira e reduzir a dependência de vendas únicas. Empresas de varejo podem oferecer pacotes de assinatura para produtos consumíveis, como cosméticos, alimentos e eletrônicos. No setor alimentício, lanchonetes e restaurantes podem criar planos de refeição por assinatura, onde os clientes recebem pedidos recorrentes, como kits de refeições ou combos semanais.

5. Desenvolvimento de produtos exclusivos para canais próprios

  • Varejo: Oferecer produtos exclusivos em seu próprio site ou loja física é uma forma de incentivar os consumidores a comprarem diretamente da marca. Esses produtos podem ter características especiais ou edições limitadas, algo que os marketplaces não oferecem, agregando valor e exclusividade à experiência de compra.
  • Alimentação: Restaurantes podem criar pratos ou combos exclusivos para quem faz o pedido diretamente, oferecendo uma vantagem competitiva para os consumidores que optarem por não usar aplicativos como o iFood.

6. Investir em programas de recompensas e experiência do cliente

  • Varejo e Alimentação: Enquanto programas de fidelidade são comuns, as empresas podem ir além e oferecer experiências diferenciadas para seus clientes mais fiéis. No varejo, isso pode incluir eventos exclusivos para os melhores clientes, acesso antecipado a lançamentos ou até mesmo convites para eventos da marca. No setor de alimentação, clientes frequentes podem ser convidados para degustações exclusivas ou terem acesso a pratos que não estão no cardápio regular.

7. Apostar em publicidade offline

  • Varejo: Embora o foco esteja nas estratégias digitais, a publicidade offline ainda tem um papel relevante, especialmente para marcas locais. Investir em anúncios em rádios, jornais locais, outdoors ou flyers pode ajudar a aumentar o reconhecimento da marca fora dos marketplaces.
  • Alimentação: Para lanchonetes e restaurantes, o marketing local em regiões próximas ao ponto físico, com panfletos, sinalização de rua ou parceria com eventos locais, pode atrair clientes que preferem fazer pedidos ou retirar no local.

Essas soluções complementam as estratégias já discutidas e oferecem formas adicionais de aumentar a independência dos marketplaces. Cada uma dessas táticas ajuda a construir uma base sólida de vendas diretas, melhorar a experiência do cliente e fortalecer a marca no mercado.

O Futuro dos Marketplaces e as relações comerciais

O futuro dos marketplaces traz novos desafios e oportunidades. Com o aumento da regulação e as discussões sobre taxas abusivas cobradas por algumas plataformas, pode ser que vejamos mudanças no modelo de negócios dos marketplaces no Brasil. Empresas que já investem em diversificação estarão melhor posicionadas para lidar com essas mudanças e aproveitar as novas oportunidades.

Plataformas como Mercado Livre, por exemplo, estão desenvolvendo novos programas para fortalecer o relacionamento com seus vendedores. O Mercado Livre tem oferecido soluções logísticas aprimoradas, como o Mercado Envios, que facilita a operação e entrega dos produtos, além de parcerias com fintechs para oferecer crédito a vendedores. Programas de marketing patrocinado dentro da plataforma também foram ampliados, permitindo que os vendedores paguem para destacar seus produtos em meio à concorrência.

O iFood, por sua vez, está investindo em iniciativas que aproximam o consumidor dos restaurantes, como programas de fidelidade. Esses programas oferecem benefícios para os consumidores que compram regularmente de um mesmo restaurante, incentivando a recorrência e gerando um relacionamento mais direto com o vendedor. Além disso, o iFood continua a expandir suas soluções logísticas, ajudando restaurantes a otimizar suas operações de entrega.

Por outro lado, também é possível que os marketplaces passem a oferecer mais ferramentas para os vendedores construírem suas marcas dentro da plataforma, como já faz a Amazon com seu programa “Brand Registry”, que permite a proteção da marca e a criação de uma loja personalizada dentro do marketplace.

Considerações Finais: liberte-se da Síndrome de Estocolmo

Os marketplaces são ferramentas poderosas, mas é preciso usá-las com cautela. Dependência excessiva de qualquer canal de vendas pode colocar o futuro do seu negócio em risco. Para evitar a “Síndrome de Estocolmo” no seu negócio, é crucial diversificar suas fontes de receita, investir em marketing e aprender a construir uma marca forte e independente.

Os empresários brasileiros precisam reavaliar sua relação com os marketplaces e buscar um equilíbrio entre a conveniência que essas plataformas oferecem e a necessidade de criar e manter um negócio verdadeiramente sustentável e independente.

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