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A falácia do “humanizado”: estamos precisando relembrar que somos humanos?

Nos últimos anos, o termo “humanizado” tem sido repetido exaustivamente. Em todos os lugares e contextos, ele aparece para qualificar interações e relações no trabalho. Surgem promessas de atendimento humanizado, comunicação humanizada, medicina humanizada, liderança humanizada — como se tudo isso fosse um diferencial, algo fora do comum e que agora, milagrosamente, esteja sendo implementado. O que deveria soar como algo natural parece estar sendo usado como um slogan para vender soluções de mercado, como se as relações no trabalho e em outros contextos não tivessem, desde sempre, um ser humano de cada lado.

Então, cabe a pergunta: o que significa esse “humanizado” que tanto tem se falado? De duas, uma: ou a palavra virou um jargão para impulsionar o marketing em torno de produtos e serviços, ou estamos diante de um problema sério e generalizado em que precisamos mesmo resgatar o que é essencialmente humano nas relações. Mas isso é realmente necessário?

A necessidade de humanizar o que já deveria ser humano

Trabalhar é, antes de tudo, organizar pessoas e processos para gerar resultados e criar valor. Desde o princípio, qualquer empresa depende da organização dos esforços humanos, sendo impossível imaginar uma estrutura que funcione exclusivamente sem esse elemento essencial. Se isso não está claro, o termo “humanizado” é uma forma de alertar que as relações se deterioraram a um ponto em que precisamos resgatar o básico: interações feitas de ser humano para ser humano. Contudo, se já está claro que uma empresa é, em sua essência, composta por relações humanas, não precisaríamos relembrar isso a cada discurso, palestra ou treinamento.

A reflexão inevitável é se as empresas não estão apenas superficializando o uso da palavra “humanizado” como uma estratégia de marketing. Afinal, no mercado de trabalho, palavras como essa têm apelo. Quem não gostaria de receber um atendimento “humanizado”, de trabalhar em um ambiente onde a liderança é “humanizada”? No entanto, quantas dessas promessas realmente se convertem em práticas autênticas? E se o termo vende bem e atende às demandas atuais, parece haver uma tendência de esvaziamento do seu real significado.

De “humanizado” para “re-humanizado”: o perigo de desumanizar a linguagem

Com o passar do tempo, a repetição de termos como “humanizado” em contextos que já são, de natureza, humanos pode levar a um cenário ainda mais crítico. Daqui a pouco, talvez não demore para que surja um termo como “re-humanizar”, como se fosse possível “reintroduzir” o ser humano que, supostamente, deixou de ser humano. A questão é: será que precisamos mesmo desse processo de “humanização” ou estamos simplesmente precisando melhorar nossas práticas e entender o ser humano de forma mais profunda?

O uso indiscriminado de termos como esse nos distancia do que é genuíno. Precisamos voltar ao ponto de partida: olhar para o ser humano que está por trás das relações, entender suas necessidades, e agir com empatia, promovendo um ambiente de trabalho que respeite o que nos torna humanos. Não se trata de criar um produto para ser vendido, mas de criar um ambiente de trabalho onde a empatia, o respeito e a autenticidade sejam naturalmente incorporados no dia a dia da empresa.

Automatização e tecnologia: aliados, mas não substitutos da empatia

Quando as relações humanas no trabalho começam a ser reduzidas a simples processos “automatizáveis”, abrimos a porta para substituir interações genuínas por ações pré-programadas. E aqui não se trata de criticar a tecnologia. Muito pelo contrário, sabemos o quanto os sistemas e a inteligência artificial têm a oferecer à gestão, otimizando processos, facilitando operações e liberando tempo para que as pessoas possam focar em atividades mais estratégicas. A questão, portanto, não é escolher entre o humano e o tecnológico, mas entender que o humano vem sempre antes do tecnológico.

Devemos ter em mente que, para qualquer decisão ou processo dentro da empresa, há um ser humano envolvido — seja na concepção, na execução ou na avaliação. Isso não é opcional. E é aí que entra a necessidade de um pensamento crítico. Sim, podemos automatizar muitas tarefas e facilitar a execução de outras tantas, mas as decisões principais e o olhar empático e estratégico que definem as interações e os processos precisam ser sempre guiados por uma perspectiva humana.

A empatia não é opcional. É uma qualidade fundamental para que o trabalho flua com respeito e autenticidade. Ela nos ajuda a compreender os erros e acertos de forma madura, sabendo que todos estamos suscetíveis a falhas, mas prontos para reconhecer e melhorar quando necessário.

A ilusão da “humanização” e o perigo da superficialidade

À medida que livros e palestras proliferam em torno do conceito de “humanização” das relações de trabalho, precisamos refletir se, em algum momento, perdemos a essência das relações no ambiente corporativo. Esses conteúdos vendem a ideia de que é necessário transformar as interações entre colegas, líderes e subordinados em algo supostamente “humanizado”, como se isso não fosse natural ou necessário em qualquer situação. Esse jargão, que vende a promessa de uma empresa mais “humana”, muitas vezes se revela uma solução superficial, incapaz de oferecer mudanças reais.

A superficialidade dessas propostas pode ser identificada pela ausência de mudanças estruturais nas empresas que promovem essa ideia. É fácil lançar uma campanha de comunicação “humanizada” ou falar sobre “liderança humanizada”, mas transformar isso em prática exige repensar, e às vezes reformular, processos e relações que estão enraizados nas rotinas organizacionais. Se não existe uma cultura genuína de respeito e empatia, de nada adianta rotular práticas como “humanizadas”. O resultado será apenas um conceito vazio.

Resgatando o que já é humano: a autenticidade como pilar

Se a solução para melhorar o ambiente de trabalho e fortalecer as relações passa por algum termo, esse termo precisa ser autenticidade. De fato, precisamos resgatar a autenticidade nas interações. Isso significa que a empresa deve estimular as pessoas a se expressarem de maneira transparente, incentivando a honestidade nas relações. É preciso focar em práticas onde o erro seja encarado como parte do processo, onde haja abertura para discussões construtivas e onde cada colaborador seja visto como parte essencial do funcionamento da empresa.

Ser autêntico no trabalho não significa dispensar a tecnologia, mas sim utilizá-la com sabedoria e propósito. Isso nos leva a pensar nos processos de uma forma mais madura, compreendendo que são as pessoas que fazem a diferença e não os rótulos. Em vez de usar o termo “humanizado” como um diferencial, que tal focar no que realmente importa? O ambiente de trabalho precisa oferecer a atenção devida, a valorização da individualidade e o respeito às limitações humanas.

O equilíbrio entre tecnologia e relações humanas

Para manter esse equilíbrio, a tecnologia deve ser usada para potencializar o trabalho humano, não para suprimi-lo ou mascará-lo. Ferramentas tecnológicas existem para apoiar os processos e dar condições para que as pessoas desempenhem suas funções de maneira mais eficaz. No entanto, é crucial que, por trás da implementação dessas ferramentas, exista um pensamento crítico e empático, que leve em conta as necessidades e as particularidades de cada colaborador.

Na prática, isso se traduz em uma postura de empatia e abertura para lidar com as dificuldades, as dúvidas e as limitações dos membros da equipe. As relações de trabalho que priorizam essa abordagem oferecem espaço para que as pessoas se sintam seguras em pedir ajuda, em reconhecer os próprios erros e em crescer dentro de um ambiente que valoriza o aprendizado contínuo e a melhoria constante.

Conclusão: muito além do “humanizado”

Precisamos, como empresários, gestores e líderes, de uma reflexão profunda sobre as relações humanas no trabalho, sem a necessidade de rótulos como “humanizado” para descrever o que deveria ser natural. Mais do que um conceito de marketing, é essencial que as empresas ofereçam um espaço onde o respeito e a autenticidade sejam valores inegociáveis. Assim, criaremos um ambiente de trabalho onde a tecnologia serve para potencializar a eficiência e a criatividade das pessoas, mas onde as decisões, processos e interações continuam a ser, essencialmente, humanas.

Essas mudanças vão muito além de qualquer rótulo. Elas requerem um compromisso real com a construção de uma cultura de respeito e autenticidade, onde cada colaborador se sinta visto e valorizado. Mais do que adotar modismos, o desafio é relembrar o que sempre esteve presente: o ser humano por trás de cada relação, de cada processo e de cada tecnologia. Ao focarmos nisso, não será mais necessário humanizar aquilo que já deveria ser, naturalmente, humano.

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